Introdução: O diagnóstico diferencial entre cardiomiopatia hipertrófica (CMH) e amiloidose cardíaca (AC) é extremamente desafiador e tem impacto prognóstico quando oferecido tratamento específico. O estudo genético, agora disponível na prática clínica, apresenta-se como importante ferramenta diagnóstica nesses casos, aliado aos dados clínicos e exames complementares. Tanto na CMH quanto na AC é possível ser portador de variante patogênica, sem expressar o fenótipo destas. E quando um paciente é portador de mutações patogênicas tanto para CMH quanto para AC? A seguir, descreveremos dois casos em que os pacientes apresentam as duas mutações:
Caso 1: masculino, branco, 43 anos, com palpitações, dor torácica, parestesias e pré-síncope. Descartada doença coronariana pela cineangiocoronariografia. Eletrocardiograma (ECG): ritmo sinusal (RS) e bloqueio do ramo esquerdo.Ecocardiograma (ECO): fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE): 66%, espessura septal de 23 mm e parede lateral (PL) de 11 mm, obstrução intraventricular e em via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE), com movimentação sistólica anterior (SAM) da valva mitral. Ressonância Magnética (RNM): realce tardio focal em septo mediobasal e nas junções das paredes anterior e posterior do ventrículo direito. Teste genético com mutações patogênica no gene da transtirretina (Val142Ile) e no gene da tropomiosina (TPM1). A cintilografia com pirofosfato foi negativa para amiloidose (Grau 1). Realizada ablação septal por radiofrequência.
Caso 2: masculino, branco, 12 anos, com dispneia, dor torácica e palpitações. ECG: RS, sobrecarga do VE, eixo -150◦, Q patológica V4 – V6. ECO: FEVE 74%, espessura septal de 30mm e PL de 8mm. SGL do VE reduzido, sem obstrução. RNM: SAM da valva mitral e realce tardio mesocárdico e multifocalde padrão não coronariano. Holter sem arritmias. Teste genético com mutações patogênicas do gene da transtirretina (Val142Ile) e do gene MYBPC3 (Arg495Gln). Implantado CDI.
Discussão: Nos casos descritos, tem-se fenótipo hipertrófico e a presença de mutações patogênicas para CMH e AC. No caso 1, o paciente apresenta sintomas que sugerem as duas doenças, porém somente a CMH justifica a evolução clínica observada. No caso 2, apesar de apresentar ambos os genótipos, somente a CMH está expressa clinicamente. Casos em que o fenótipo da hipertrofia não é típico, o achado de alguma variante patogênica tem sido utilizado como ferramenta diagnóstica. Porém mostramos dois casos que ilustram que o estudo genético isolado não deve ser o principal norteador para definição adequada do diagnóstico.